domingo, 28 de novembro de 2010

Uma vontade repentina

Foi uma vontade repentina de um domingo à noite. Uma vontade de segurar os minutos pelas mãos e delicadamente lhe pedir calma. Fechar-lhe os olhos fechando os meus ao mesmo tempo, pedindo-lhe calma com eco para mim mesma. Pegar os minutos pelas mãos e passear sobre as sombras de luzes que sobram no mar e ir para lugares em que as pessoas não vão e parar para observar coisas que as pessoas nem veem. Uma vontade repentina de um domingo à noite de caminhar na areia fria e refletir desenhos abstratos, de gritar coisas que eu não digo e repetir o que eu já disse, enfatizando partes que ficaram ocultas. Pegar os minutos pelas mãos e deitá-lo na cama enquanto eu possa discretamente sair e viver. Viver sem pressa. Respirar sem pressa. Pressa que nem vem do tempo, vem de mim. Uma pressa que me desperta às quatro da manhã e me chacoalha e me interroga. Pressa que me faz correr e ver tudo de perto sendo que a nitidez vem da distância. Uma vontade repentina de um domingo à noite de sentar e com calma esperar o sol nascer, molhar os pés nos primeiros raios do dia e ir embora aceitando plenamente que ele tem que continuar.

A resistência

Eu não sei lidar com a leveza. Desapareceria se tirasse todo o peso do mundo que coloco sobre as minhas costas. E sobre as costas dos outros. E sobre as costas do mundo. Essas noites geladas trazem um ventinho de saudade, frio, mas tão bom. E voltamos a vasculhar todos os objetos e palavras e coisas sem formas que jogamos pra dentro, para algum lugar dentro de nós, sabendo que não estávamos guardando direito, mas aliviados porque de alguma maneira estávamos guardando e procuraríamos um dia, um dia como hoje, um dia como esse. E é um riso tão involuntário que a lembrança causa e se nos deixarmos levar chegamos à gargalhada que de tão intensa chega a um quase chorar. E uma falta de ar que se compara a uma quase dor, uma falta de sentido, talvez parecida à dor do nascimento, como a primeira respiração, o primeiro sim. Mas temos que voltar a respirar e recuperar o sentido e nascer de novo, mesmo sabendo que dói nascer todos os dias. E lá se vai mais um sim e mais um dia e mais um nascer, para quem sabe encontrar a gargalhada da memória no final da noite e morrer de novo. Morrer sem ar, só para ter a chance de mais um sim. Mais um sim após os sonhos, os verdadeiros sonhos. Aqueles que vêm tarde da noite, após horas de espera a observar as camadas das brancas paredes do quarto. E então ele vem. Adoro sonhar. Egoísta eu sempre fui, mas nos sonhos, só nesses realmente posso ser. E sou. Nos sonhos eu continuo o que o tempo terminou, o que ele me tirou sem dizer uma palavra e eu, em silêncio, apenas balancei a cabeça, sussurrando em seu ouvido: espere os sonhos, espere os meus sonhos. Meus sonhos são a minha vingança. São a minha resistência. E sei, eu sei, toda resistência é perseguida. Essa é uma das coisas que mais me dão paz. Uma das minhas únicas certezas. Não há porque temer a solidão, sozinha eu nunca estarei. Os meus sonhos são a minha vingança. Eu sou a resistência.