terça-feira, 27 de abril de 2010

Eu não queria abraçar sozinha

Eu queria abraçar o mundo, mas não quero ficar abraçando sempre sozinha. Eu queria dividir o mundo, mas às vezes eu fico lá, esperando horas e então, não consigo esperar mais. Eu abraço sozinha, mas não queria, não sempre. Querer. Eu sempre quero, quero muito, às vezes eu acabo querendo tanto que deixo de lado tudo o que eu tenho só para querer. Hoje tinha uma lua linda. Eu sorri pra ela e ela se escondeu, ela foi sorrir em outros cantos. Ela fugiu. Assim como eu, eu vivo fugindo. Eu rasguei tantas folhas que sequer escrevi, desliguei sons que nem escutei, rejeitei tantos beijos, tantos beijos, eu cheguei tão perto. Eu cheguei a sentir o ar quente, os lábios macios, as mãos me contornando então eu desisti. Eu magoei tanto, tantos. Eu aceitei tantos beijos, mas não quis o amor. Porque ele é grande demais e eu sou tão pequenininha. Ele controla demais e eu odeio ser controlada. Ele é forte demais e eu também finjo ser, eu não posso enfrentá-lo pra não acabar com a minha farsa. Eu não quis. Depois do querer eu não quis mais nada. Eu viajei horas só pra querer, eu atravessei o mar e atravessei estados e atravessei os sonhos e me atravessei, só por querer, eu sempre quis, quis algo que eu não sei. Que eu não sei saber. Eu vou indo e querendo e vejo as pessoas parando e vivendo e eu vou indo e sendo julgada, mal interpretada, sozinha e tudo isso porque eu não queria abraçar o mundo sozinha. Até onde vai a estrada? Eu preciso saber. Não pra parar e evitar o vão, mas só pra saber a hora que vou ter que usar asas.

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Sobre nós

Ele pediu para eu escrever um texto sobre nós. Eu não queria decepcioná-lo, mas eu não sei escrever. Eu vou fingir e tentar só porque eu não quero decepcioná-lo. Eu o odeio porque ele destrói muita coisa que eu demorei a minha vida inteira para construir. Ele destrói o meu silêncio. Eu odeio conversar com ele porque ele é a única pessoa que eu consigo dizer absolutamente tudo, sem nenhum medo, sem nenhuma vergonha, sem nenhum risco de ser incompreendida, mesmo sendo muitas vezes, mas sem nenhum risco. Eu odeio porque eu digo tudo o que eu quero e não quero dizer depois ocupo toda a minha insônia pensando que eu não deveria ter dito 10% do que eu disse. E eu sei que às vezes ele ocupa a insônia dele pensando que eu não deveria ter dito 10% do que eu disse. Mas ele me escuta, coitado, ele me escuta, eu gosto disso. Eu gosto dele, mas ele me odeia. Eu odeio ele, mas ele gosta de mim. Nós somos metade/metade e vivemos trocando as metades. Ele diz que eu sou uma devoradora de surfistas positividade e eu digo que ele é um devorador de meninas com calça colorida. Mas na verdade, nós não somos devoradores de nada. Nem de surfistas nem de coloridos boys/girls. Não somos devoradores de nada além de nós mesmos, dos nossos mundos. Dos nossos mundos paralelos. Eu brinco que ele é meu amigo gay, ele fica bravo e diz que se eu continuar com essa idiotice ele vai me esquartejar e me chamar de Mari caminhoneira. Eu não sou caminhoneira, nem ele gay, mas eu adoro deixar ele irritado. Às vezes a gente troca de papel, eu fico fria e indiferente e ele fica histérico e sentimental, mas normalmente, nós não somos nada disso. Nós não somos nada. Somos apenas nós e muitas vezes não sabemos lidar com isso, ás vezes nós queremos não ser nós e sim qualquer verme rastejante. Outras nós queremos ser rockstars e dominar o mundo, ou então revolucionários e mudar o mundo. Mas nós não somos nada. Nós somos nós. Um nós longe do mundo. Um nós de outro mundo. Ele me pediu em casamento e eu aceitei. A gente casa quando completar 85 anos. Já está tudo certo. Nós vamos estar surdos, cegos e chatos. Daí vai da tudo certo. Eu acho e ele também acha. Eu mandei uma mensagem pra ele no pior aniversário de toda a minha vida. Eu disse que estava num lugar que não deveria, ele me respondeu dizendo que estava conversando com quem não deveria. Eu disse que queria que ele estivesse aqui, ele disse que também queria estar. Ele me fez rir no pior aniversário de toda a minha vida. Eu continuei a noite e ele foi dormir, também não era o melhor dia da vida dele. Ele está lá e eu aqui. Eu queria que ele estivesse aqui e ele queria que eu estivesse lá. Ele ama Strokes e eu amo Arctic. Ele é completamente cego eu to quase lá. Ele toca bateria eu arranho uma guitarra. Eu canto e ele é cantado. Ele canta e eu sou cantada. Ele viu a avó dele pelada, eu nunca vou esquecer isso. Eu sou existencialista e ele também é. Ele não gosta de mudar e eu vivo fazendo isso. Ele odeia praia e eu adoro. Ele é sedentário e eu já fui atleta. Ele é negativo e eu sou positiva, mas às vezes a gente troca as pilhas. A gente conversa o dia inteiro e não acaba o assunto. A gente briga, da tempo, separa e termina como casal, mas a gente nunca foi casal. Nós somos apenas dois loucos, perdidos, sozinhos conversando com seus objetos e morrendo de vontade de mandar tudo para a puta que o pariu. Nós somos apenas dois loucos só esperando que tudo isso algum dia acabe.

As sandálias de plástico e o rock and roll

Sandálias de plástico dão chulé. A chuva me deixa introspectiva, depressiva, com vontade fazer música sem conseguir, com vontade escrever sem conseguir, com vontade fazer algo, qualquer coisa, sem conseguir. Às vezes tudo o que você precisa está perto demais para poder ser visto. A distância é necessária, mas me irrita. Não existe música pra se ouvir na chuva, porque todas, até as mais pulantes, dançantes, alegres, são tristes. Não existe programa pra assistir na chuva, porque todos são fúteis. Não existe pessoa pra conversar na chuva, porque todas são chatas. Não da pra ficar sozinha na chuva, porque é melancólico. Mas a questão é que sandálias de plástico dão chulé. Mas a gente usa. Nenhuma droga me droga, a minha consciência é muita mais forte que elas e eu não consigo me livrar da minha consciência. Às vezes eu só queria ser o elenco pobre de novela. Dançar em um churrasco com pagode no domingo, beber uma cerveja no bar do Zé, andar feliz, bonita e sorrindo dentro do ônibus, vestir o macacão e ir para firma. Mas eu sou o elenco pobre fora da novela. Domingo, segunda, terça, quarta, quinta e sexta eu como miojo alterando só o sabor de 4 queijos, feijãozinho, picanha, tomate e galinha. Mas sem pagode, porque eu O-D-E-I-O pagode e a felicidade do pagode e a batidinha do pagode e as rimas de pagode e todas as dançinhas do pagode. Eu não posso ir pro bar do Zé beber cerveja porque eu O-D-E-I-O cerveja e não conheço nenhum Zé que tenha bar. Eu ando de ônibus, mas nada de feliz, bonita e sorrindo. Eu ando suada me equilibrando e minha expressão fica bem distante do sorriso. Eu não vou pra firma, mas pra algum lugar eu tenho que ir né. Eu escrevo toda essa inútil baboseira só pra dizer sutilmente que esqueceram de adicionar a palavra satisfação no meu sistema. Que não é a distância, o pagode, o miojo nem o chulé das sandálias de plástico, é um buraco no meio da minha barriga, bem pra cima do umbigo um pouquinho pro lado do peito. É um buraco que insiste em ficar vazio e escuro, eu não posso enxergar lá dentro. E tem tantos objetos perdidos que eu queria encontrar. Mas ele fica lá, gigante, escuro e vazio. E eu fico aqui, com a chuva, as sandálias de plástico e o rock and roll.

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Eu quero só viver

Não me dê asas, porque o meu prazer é poder voar sem elas. Inventar alguma coisa, sei lá, saltar com um guarda-chuva, levantar voo com um guardanapo, aterrissar em um guarda-sonhos, bagunçar um guarda-roupas, criar guarda-ventos, só pra guardar um pedacinho das coisas que não se guardam. Por favor, não tente me dar nada, nem flores, nem jóias, nem carros, nem viagens, porque o que me interessa mesmo é a vista, seja de onde for, para onde for ou pra onde me levar. Seja da montanha mais alta, dos buracos mais fundos, da laje, da cobertura, do pôr do sol, da chuva, da fazenda, da casinha de sapê. Mas não quero as vistas que me dão, e sim as vistas que eu procuro, as vistas que só eu posso ver. Me dê palavras. Essas eu quero e guardo, mas saiba que algum dia eu vou devolvê-las a você. Da minha maneira, é claro. Guardarei a sua pra mim, só pra recordar as coisas que minha memória com o tempo irá apagar. Fora isso eu te peço vida, não se preocupe, também darei a minha em troca. O que eu busco nos outros, em todos os outros é vida, são sonhos, promessas, olhares, gargalhadas entaladas, sorrisos de canto de boca. Me dê seus sinais vitais para eu realimentar os meus. Não me diga que o modo que vivo é errado, assim não direi que o certo e errado não existem além da sua cabeça. Não me diga que o que eu acredito é falso, pois o acreditar é um espelho que reflete bem mais do que você pode ver. O que se pode querer dessa vida, meu deus? O que se pode querer além de viver? O que se pode querer se nada me impede de ver o sol nascer do outro lado do oceano, de descobrir coisas, ir desbravando, amando, vivendo. O que mais se pode querer? O que mais se pode além de viver? Eu? Eu não quero mais nada. Quero só me livrar dos vícios, mas carregar alguns para sempre. Quero só a simplicidade, deixo o resto para você. Eu quero só viver o mundo, eu quero só viver. Mas não me dê asas, porque isso, ah, isso é o meu prazer. É o meu maior prazer. Eu quero continuar guardando meus amigos em cada célula em mim, eu quero mais células, mais sangue, mais movimento, quem sabe o vento, todos podemos querer o vento, mas não o tempo, o tempo eu deixo para algum louco, deixe o tempo fora disso. Eu quero manter minhas neuroses, minhas histerias, meu silêncio, minha angústia, minha gritaria interna. Eu quero tudo isso. Eu quero continuar sendo isso. Eu quero o medo também, muito medo, quero as mãos geladas, suor frio, eu quero o medo só pra vencer. Eu quero me manter só pra viver, só pra viver. Hoje eu faço 2.0, mas não quero nem saber em quantos zeros eu vou chegar, dezenas, centenas, milhares, eu quero só chegar, onde tiver que ser, onde eu quiser que seja. Eu? Ah, eu quero só viver, eu quero só voar e aterrissar em um canto qualquer.Porque esse, ah, esse é o meu prazer.

domingo, 11 de abril de 2010

A merda do objetivo

Hoje eu passei o dia inteiro aqui. Assim. Na mesma posição que terminei o dia anterior, pensando nas mesmas coisas de todos os outros dias. A gente vai morrer sem ter feito nada. A gente vai sonhar para depois esquecer. A gente vai dançar como se ninguém estivesse vendo, olhando para todos os lados só para ter certeza. A gente vai provar sem realmente ter experimentado e espirrar sem ser involuntariamente forçado. A gente vai morrer sem ter feito nada. Na mesma posição do dia anterior. Ontem, eu vi pessoas sozinhas na mesa do bar com olhares perdidos e uma lata de coca-cola na mão. Outras pessoas em pé dançando loucamente músicas que elas nem conheciam e alguns casais com cara de tédio, muito tédio. Os vestidinhos, as meias e as bolsinhas retrô. Os sapatos ridículos e os óculos gigantes. Porque a moda agora é ser brega. Mas ser brega de propósito. Se você é brega sem querer, passa a ser o brega fora do brega fashion. Esse tipo de coisa super relevante que salva nossa vida quando a gente se encontra na mesma posição do dia anterior. Todas as pessoas com um único objetivo fingindo desconhecer. Todas as roupas e as músicas e os sapatos e os óculos e os bregas com as mesmas merdas de objetivos, fingindo não saber qual é a merda do objetivo. E os olhares perdidos tentavam fugir da luz procurando na escuridão o que na verdade não pode ser visto. Os casais do tédio tentando ver no outro o que não existe mais. As meninas brega fashion tentando viver o que já passou. Os meninos brega fashion tentando ser o que nunca serão e todos fodendo a merda do mesmo objetivo. Afogando-o com álcool, sufocando com a fumaça, ensurdecendo com a música, com a dança, com o vômito, com o vazio. O vazio é o grande responsável por encher esses lugares. O vazio, a incerteza, a falta de direção, a falta de lógica nas coisas. A quantidade de perguntas que temos para a quantidade de respostas que nos dão. A quantidade de tempo que nos resta para a quantidade de tempo que achamos ter. O sabor que tiraram das coisas, a beleza que photoshoparam, as coisas que inventam para gente acreditar e procurar e se sentir um bosta quando não conseguir sem saber que a gente não consegue, não encontra e não acredita, porque simplesmente não existe. Ontem eu vi pessoas sozinhas com olhares perdidos na mesa do bar, outras dançando loucamente e casais do tédio. Ontem, antes de eu estar aqui na posição que estou hoje, eu estava sentada, sozinha, com o olhar perdido e uma lata de coca-cola na mão fingindo desconhecer a merda objetivo.

sexta-feira, 9 de abril de 2010

É tempo

Talvez porque eu seja fogo eu goste do mar. Porque eu não posso tocar sem me destruir. Eu gosto de tudo que eu possa tocar e me decompor, só para poder compor de novo em outro rítmo, outro tom ou quem sabe em sinfonias vizinhas. Gosto de tudo que fica além das minhas linhas e eu não posso pegar. Tudo que fica além do meu ouvido e eu não posso ouvir. Tudo que fica abaixo da minha garganta e eu não posso dizer. Eu gosto de tudo que não existe. Porque assim eu mantenho a esperança de algum dia existir para eu poder acreditar em outra coisa. Todo mundo devia acreditar em outra coisa, só para gente fugir da rotina, ou ela fugir da gente. Não sei ao certo quem cansa mais. Se ela ou eu. Hoje em dia nós não. Nós apenas não. Nós não corremos, não lutamos, não gritamos. Nós permanecemos e o tempo vai. Mas chega um dia em que nós é quem vamos e ele permanece. É engraçado. O tempo tem tempo e vai. Nós não temos e ficamos. É realmente muito engraçado. Não, não é engraçado. Não concorde, pense. Por quê? Você tem ido, foi, irá? Tentou, tenta, tentará? Quando? Quem? Onde? Notícias são assim. Quando. Quem. Onde. Por quê. Nós somos assim. É, assim. Simplesmente assim. Sem perguntas. Vamos, pergunte, não tenha medo. Também não demore, não tenho todo tempo do mundo e mesmo que tivesse não daria ao mundo todo o tempo que tenho. Não é preciso dar tudo que se tem, já que ninguém tem mais nada que não dê para dar. Esqueça de dar tempo ao tempo, ele já tem o suficiente, quem não tem somos nós. Você não vê isso? Somos nós que não temos. Mas tudo bem, esqueça o ter, apenas vá fazendo, já que no fim, o nada é tudo que teremos. Isso é fato. É ato. É tempo.